Tudo que ela queria era começar a viver. Passou a vida estudando, planejando e fugindo de romances, namoros e paqueras porque ainda não era o momento. Pensava em seus estudos. Não desperdiçava nenhuma hora se divertindo. Precisava se formar com louvor e ser a primeira da classe.
Sempre foi assim. Desde os tempos de colégio. Nunca tirou uma nota baixa. Nunca pegou uma recuperação e só matou aulas nas vezes que ficará muito doente e não conseguia sair da cama. E mesmo assim em 15 anos de estudos se contava nos dedos as quantidades de faltas em seus boletins.
Nas férias, ficava em casa estudando. Adiantando matérias do próximo ano ou revendo o que foi aprendido. Nunca pediu um brinquedo de presente. Sempre livros, apostilas e materiais escolares. Não tinha amigos e fazia todos os trabalhos sozinha. E quando era obrigada a fazer em dupla, ou em grupo, fazia sozinha igual e colocava o nome dos outros colegas.
Seus pais se preocupavam. Não acham normal toda essa obsessão. Levaram a menina à médicos, psicólogos, psiquiatras, terapeutas alternativos e até a centros espiritas. Todos, sem exceção, diziam que ela estava ótima e não havia nada de anormal.
Aquele, enfim, era o dia da sua libertação. Dia da formatura na faculdade de medicina. Estava com a residência garantida em um dos melhores hospitais da cidade. Era a oradora da turma e seria a única aluna a ser laureada.
Estava também cedendo aos amores. Havia um colega de faculdade, muito especial. Que sempre a paquerou e, ela decidiu, que após o baile, sairia com ele. Era o grande dia. Seus objetivos estavam conquistados e agora poderia sorrir e se divertir.
Saiu de casa, cheia de vida e esperança no novo começo, para se arrumar em um salão de beleza. Cabelo, maquiagem, depilação, mãos, pés e até uma massagem relaxante. Merecia aquilo. Parou na esquina para pegar um táxi. Não entendeu bem a correria das pessoas e sua volta. E tudo ficou preto.
No outro dia a manchete do jornal local era trágica: Menina morre de bala perdida horas antes da formatura.
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