Crônica da Júlia (ou de como os vídeos ficaram longos demais)
- Lu Aranha
- 25 de jun.
- 2 min de leitura

Eu tenho uma Júlia. Todo mundo que habita esse mundo virtual precisa ter uma Júlia pra chamar de sua. A Júlia é aquela voz da razão com fone de ouvido e dedo rápido no cronômetro.
— Lu, UM minuto! UM minuto! O povo não assiste mais do que isso, você sabe!
E eu fico olhando pra ela com a paciência que só os romancistas entendem. Um minuto? Júlia, meu bem, eu gasto isso só pra respirar fundo antes de começar a falar de sentimento.
A Júlia reclama dos meus vídeos. Reclama dos suspiros, dos silêncios poéticos, das digressões líricas sobre o dia em que eu escrevi um livro só por causa da bunda, e que bunda!, de um amigo meu (só amigo, lastimas!). Ela quer que eu me atenha ao roteiro. Mas o que a Júlia não entende é que eu sou escritora de narrativas longas.
Não sou fã da concisão porque amo a prolixidade. Eu carrego palavras como quem carrega malas em estações antigas: pesadas, com etiquetas de lugares por onde passei e sentimentos que ainda me acompanham. As palavras precisam provocar reações, envolvendo-se uma na outra pra dar sentido ao vazio dos monólogos individuais.
E veja bem, Júlia, já tentei ser objetiva. Mas fui infeliz. Quando me pedem que eu vá direto ao ponto, eu perco o caminho.
Nos bastidores dos vídeos, ela me olha com olhos de quem calcula alcance, retenção, engajamento. Eu, do outro lado, olho para o vento que passa e me lembra uma personagem esquecida num conto antigo. Uma senhorinha de nome Dulce que envenena e mata os vizinhos. E lá vou eu de novo.
É assim que nascem meus livros: entre desvios, memórias, personagens que me puxam pela saia. Já escrevi sobre julgamentos que viraram gargalhadas em Treze dias com ela. Já mergulhei na raiva em Filhas da Terra e na ternura em Valeu, Universo! e até ensinei a como sobreviver a uma traição em As vantagens de ser traída. Já acreditei em feliz para sempre em Amor Virtual e aprendi que só você preenche o vazio em Eu era a sua falta.
A Júlia diz que ninguém tem tempo. Mas eu escrevo pra quem ainda sente.
E no fundo, a Júlia sabe disso. Por isso ela volta no dia seguinte, fone no ouvido, checklist na mão, e diz com um meio sorriso:
— Tá, faz teu caos aí… mas tenta não passar de um minuto e meio.
E eu prometo. Juro mesmo. Mas aí lembro de uma frase que esqueci de dizer ontem, de uma emoção que ficou no meio da frase... e pronto. O vídeo cresce. Como crescem os textos, os livros, as saudades.
Porque no fim das contas, Júlia, eu só estou fazendo o que sempre fiz desde 2009, quando criei o blog Causos e Prosas:
Transformando sentimentos em palavras.
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